FALTA DE APOIO PREJUDICA CRIADORES BRASILEIROS DE CAMARÃO
Entrevista concedida a Revista Estados e Municípios – Ano 27 – Abril de 2013
O Presidente da Associação Brasileira de Criadores de Camarão – ABCC, Engenheiro de Pesca Itamar Rocha, formado na 1ª turma de Engenharia de Pesca do Brasil (1974) é um entusiasta e defensor da criação de camarão marinho, aproveitando as potencialidades do litoral brasileiro. Durante sua permanência na Câmara dos Deputados, como Deputado Federal pelo estado do Rio Grande do Norte (2010), encaminhou vários projetos relacionados ao setor de aquicultura, principalmente o da carcinicultura. Numa conversa com a Revista Estados e Municípios, Itamar Rocha defendeu mais incentivos para o setor, “uma atividade socialmente justa, ambientalmente responsável e, economicamente importante para o meio rural do nordeste”.
E&M – Que importância para a economia do país pode ter a criação de camarão?IR – Para uma melhor avaliação, basta considerar as exportações brasileiras de camarão cultivado entre 1998, quando saiu de 400 toneladas, e US$ 2,8 milhões para 58.450 toneladas e US$ 226 milhões em 2003. No referido ano, ocupou o 2º lugar das exportações do setor primário do Nordeste e participou com 55% das exportações do setor pesqueiro brasileiro, outro destaque foi que em 2003, o camarão cultivado do Brasil ocupou o primeiro lugar das importações de camarão pequeno e médio dos Estados Unidos. Da mesma forma, em 2004 e 2005, o camarão cultivado do Brasil ocupou o primeiro lugar das importações de camarão tropical da União Europeia. No entanto, em 2012 o camarão cultivado saiu completamente do mercado internacional.
E&M – O que provocou a queda de um mercado tão promissor?IR – Uma ação antidumping imposta pelos Estados Unidos ao camarão de vários países, inclusive do Brasil, sequenciada pela desvalorização cambial, sem qualquer compensação financeira. Com isso, o camarão brasileiro perdeu competitividade e a partir de 2004-2006 saiu completamente do mercado norte americano e reduziu drasticamente suas exportações para a Europa, obrigando os produtores a reduzir suas produções, que estacionaram em 65.000 t entre 2005 a 2009. Nessa nova realidade mercadológica, a participação do camarão cultivado do Brasil no mercado brasileiro, foi elevada de 22,0% em 2003, para 100% em 2012.
E&M –A importação de matrizes de crustáceos pode melhorar a qualidade do produto brasileiro e ajudar na exportação?IR –Não. Por isso, foi acertada a decisão do Ministério da Agricultura ao editar a IN 39/1999, que estabeleceu barreiras sanitárias contra a importação de crustáceos, protegendo a biodiversidade e a indústria da carcinicultura nacional, contra as doenças de origens virais que desde o final da década de 80 e início da década de 90, vem afetando os crustáceos marinhos, nativos e cultivados, a nível mundial e cuja medida nunca foi contestada, quer seja no âmbito da OMC ou do MERCOSUL. Esperamos que o MPA, que também editou uma Instrução Normativa (IN 14/2012), restringindo a importação de crustáceos, não ceda as reivindicações de importadores, que não tem preocupação com os graves riscos sanitários que essas operações poderiam trazer para o Brasil.
E&M – É possível dar um exemplo prático desses riscosIR –Trabalhos científicos, inclusive de autores da própria Argentina, levados ao conhecimento do MPA, mostram que o estado sanitário das populações naturais de camarões do mar da Argentina, incluindo a espécie P. muelleri, está comprometido por doenças virais de notificação obrigatória pela OIE. Portanto, a importação desse camarão como pretende setores do MPA, representa uma real ameaça para os crustáceos naturais e cultivados do Brasil. Além disso, 04 recentes artigos científicos publicados no Journal of Invertebrate Pathology, da Editora Elsevier, criticam o comércio de crustáceos sem regulação, que resultou na introdução de patógenos que se disseminaram nos recursos hídricos de diversos países, contaminando populações naturais extrativa de crustáceos (lagosta, caranguejos e camarões).
E&M – Como o sr. explica então, essa teimosia em importar esse tipo de produtoIR – Em realidade, o pretexto de importar camarão da Argentina, com históricos de serem portadores de vírus das doenças (WSSV e IHHNV), visa sobretudo abrir as portas para as importações de camarões cultivados de outros países, cujos processos de pedido de liberação de importações já estão em análise no MPA. O camarão oriundo da pesca extrativa na Argentina, cuja produção é sazonal, e que corriqueiramente utiliza a prática da triangulação de produtos exportados para o Brasil, sob as benesses tarifárias do MERCOSUL, no mínimo requer o princípio da precaução, tendo em vista que a entrada de camarões do Equador, Panamá, Colômbia, Índia, China e Vietnã, afetados por dezenas de doenças virais, via triangulação, é perfeitamente previsível, caso seja pertinente a importação do P. muelleri.
E&M – Como o sr. vê a política do governo brasileiro para o setor?IR – O Brasil, cujo potencial de exploração da aquicultura é superior a qualquer outro país, inclusive da China, pela falta de políticas públicas e prioridades para o incentivo e desenvolvimento da aquicultura, teve uma participação medíocre, correspondente a apenas 0,6% da produção mundial da aqüicultura em 2010. Além disso, a participação do Brasil na produção mundial da maricultura em 2010, segundo a FAO, foi de 0.09%. Na contramão da maioria dos países, o Brasil vem priorizando as importações (363.019 t/ a um custo de US$ 1,23 bilhão em 2012) de um produto nobre, que deveria ser líder mundial da sua produção.
E&M – Manter a proibição das importações então, é fundamental para a produção nacional?IR – A proibição das importações, além da proteção sanitária ao camarão brasileiro, irá permitir à manutenção de milhares de empregos e a criação de novos. A carcinicultura marinha desenvolve e utiliza sistemas de produção intensiva e semi-intensiva com boa lucratividade, em áreas relativamente pequenas, ideal aos programas de inclusão social no campo.O camarão cultivado vem assumindo importância social crescente no Brasil, em especial, na Região Nordeste, que responde por 98% da produção nacional desse setor e conta com 1.543 produtores, envolvendo uma área de 22.500 hectares de viveiros, gerando 70.000 empregos, diretos e indiretos, cuja produção de 75.000 toneladas de camarão em 2012, contribuir para a obtenção de uma receita de US$ 500 milhões de dólares.
E&M – Permanentemente os criadores de camarão são acusados de poluir o meio ambiente, o que sr. responde?IR – A carcinicultura marinha brasileira, ao longo dos últimos vinte anos desenvolveu (Códigos de Conduta, Programa de Biossegurança, Programa de Gestão de Qualidade na Fazenda e nas Indústrias e pratica Critérios de Manejos baseados em fundamentos que asseguram sua convivência harmônica com um meio ambiente equilibrado. Um estudo realizado em 2003, pelo Prof. Lourinaldo Cavalcanti , que analisou os parâmetros físico-químicos de uma fazenda de camarão de 170 hectares de viveiros ao longo de 1 (hum) ano, apresentou dados expressivos: incremento de 110,95% no teor de oxigênio dissolvido, uma redução de 91,64% no teor de amônia, 95,1%, no teor de nitrito e 52,84% no teor de fosfato, na água de drenagem em relação a água de captação no estuário do Rio Paraíba, o que colocou por terra os equivocados argumentos, em realidade, as falsas ilacoes que atribuem à carcinicultura uma ação negativa contra a água e a biodiversidade dos ambientes explorados. Além disso, as conclusões da Tese de Pós-Doutorado do Dr. Raul Madrid, PhD, analista ambiental do IBAMA/CE, não deixam dúvidas sobre os benefícios da carcinicultura para o equilíbrio ambiental dos ambientes explorados por este setor. Haja vista, que o item 8 de suas “Conclusões”, diz textualmente: “De forma geral pode-se dizer que, estatisticamente, a água do viveiro em termos microbiológicos é mais limpa que a água de abastecimento das fazendas, o que se permite deduzir que os viveiros de camarão atuam como piscinas de estabilização e depuração de efluentes”. Nesse mesmo estudo, o referido técnico concluiu que a água da drenagem dos viveiros do camarão apresentaram menos 30 e 35% coliformes totais e coliformes fecais do que a água de captação nos rios e estuários